domingo, 31 de março de 2013

Daviz Simango em entrevista ao SAVANA: Guebuza é que tem patrões estrangeiros

Savana 29-03-2013 Savana 29 -03-2013 15
NO CENTRO DO FURACÃO
 
Por Emídio Beúla e Raul Senda Fotos de Urgel Matula
 
A o cabo de mais um mandato como Pre-sidente da autar-quia da Beira, a segunda maior cidade do país, Daviz Simango coloca a sua corrida ao terceiro mandato nas mãos dos militantes do MDM que em Maio vão escolher os 43 candidatos às autárquicas de 20 de Novembro. Reconhece os problemas de transitabilidade das estradas da Beira e avança com soluções para um problema que diz ser mais complexo do que pode parecer. Aos recados de alguns militantes seniores da Frelimo, ele responde na mesma medida, dizendo, por exemplo, que “Guebuza é que tem pa-trões estrangeiros”. Acompanhe a entrevista feita na tarde desta quarta-feira em Maputo, onde Daviz vinha participar da reunião dos municípios, organizada pelo ministério da Administração Estatal.
 
Faltam menos de 10 meses para o término do seu (segundo) mandato como Presidente do Município da Beira. Das várias promessas que fez ao eleitorado, o que é que conseguiu concretizar?
 
Nós concorremos para as eleições de 2008 com um programa vasto que assentava em alguns pilares básicos. Estamos a falar do projecto de pro-tecção costeira, do projecto de saneamento e abastecimento de água e do projecto de integração social das nos-sas comunidades.
 
Conseguiu materializar esse programa?
 
Em relação à protecção costeira con-seguimos, através da conferência de doadores, mobilizar fundos. Vários parceiros responderam positiva-mente às nossas solicitações e hoje estão a decorrer obras de protecção costeira. A cooperação suíça finan-ciou com três milhões e duzen-tos e cinquenta mil dólares (USD 3.250.000) e o Banco Mundial vai financiar com 70 milhões de dólares (USD 70.000.000). O financiamen-to do Banco Mundial está virado para as mudanças climáticas e vai consistir numa rede de águas para a cidade da Beira. É uma malha de rede de águas para resolver o prob-lema das inundações. Como sabem, Beira é uma cidade plana, erguida sobre um pântano e as águas por si só não conseguem correr. É preciso que haja outro tipo de exercício. Do Banco Mundial estamos também a mobilizar 15 milhões de dólares (USD 15.000.000) para materializar a nossa intenção que consiste em de criar condições para que as valas ab-ertas não sejam transformadas pelos
munícipes em depósitos de lixo e outros detritos sólidos. O Conselho Municipal pretende privilegiar as margens das valas com arruamento e zonas de diversão para desencorajar a prática de hábitos que contribuam para a degradação das mesmas.
 
Conseguimos mobilizar fundos do Banco Árabe para reabilitar as valas e alargamento da rede de saneamento na zona de Macurungo. A abertura do canal de Chiveve faz parte do programa das mudanças climáticas?
 
Sim, ainda na componente mudan-ças climáticas mobilizámos cerca de 13.5 milhões de Euros através
do Banco Alemão KFW para a ab-ertura do canal de Chiveve. Neste momento, estão a decorrer estudos e já nos apresentaram, na semana passada, três propostas alternativas de abertura do canal. Nós enten-demos que com abertura do canal do Chiveve estaremos a criar condições para a respiração da nossa cidade. Vai também permitir o escoamento de águas nos bairros próximos do canal de Chiveve, reduzindo assim as pos-sibilidades de inundações.
 
Avançámos na componente de abas-tecimento de água. Na cidade da Beira existiam zonas que não tin-ham água potável. Estamos a falar dos bairros de Muavi e Inhamizua que pela primeira vez tiveram rede canalizada. Nem sempre é possível recorrer ao FIPAG (Fundo do Inves-timento e Património de Abasteci-mento de Água), temos que recorrer a parceiros ou a fundos próprios para comprar material de abastecimento da água potável.
 
Recentemente, a União Europeia financiou a reabilitação do sistema de saneamento da Beira. Que ben-efícios isso trouxe para a cidade?
 
O programa de saneamento da ci-dade consistia na reabilitação do sis-tema existente e não abrangeu novas zonas. Estamos satisfeitos porque nas zonas onde houve reabilitação melhorámos o aspecto ambiental, construímos uma ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais) que estava projectada desde os anos 60. Trata-se de uma ETAR que no futuro o Conselho Municipal pode aproveitar para a produção de bio-gás. É preciso dizer que durante o man-dato que este ano termina tivemos alguns constrangimentos.
 
A que tipo de constrangimentos se refere?
 
A perda das sedes dos bairros. Era preciso repor a administração a fun-cionar, daí que iniciámos com a con-strução das sedes dos bairros e temos a impressão de que valeu a pena, pois temos infra-estruturas novas e com adaptação para os jovens: tem sistema de internet disponível para estudantes e alunos.
No fundo, neste mandato, notamos que na cidade da Beira há um grande crescimento económico. As peque-nas e médias empresas começam a ter lugar e existem infra-estruturas. Só neste mandato tivemos quatro hotéis novos, o que não acontecia há muitos anos. Beira está hoje com estradas esbu-racadas, situação que contrasta com a imagem de uma das melhores ci-dades em termos de gestão munici-pal. Ainda vai a tempo de repor a transitabilidade das estradas da ci-dade?
A nível das estradas, a cidade da Beira tem uma característica própria: O nosso pavimento torna-se sempre alagado, sempre molhado e impróp-rio para o asfalto. Portanto, tivemos a iniciativa de avançar com estradas de pavês.
No mandato anterior, já tínhamos feito uma experiência idêntica em relação a Kruss Gomes, agora fize-mos a rua 33, estamos a fazer a rua da Chota, estamos a fazer a rua do Vaz e este ano vamos avançar com mais quatro. Estamos a fazer um es-tudo em relação à FPLM, que sai da Praça da Independência em direcção ao Estoril, estamos a falar também da estrada que parte do aeroporto em direcção à ponte, estamos a falar das ruas 2 e 6 e da rua da Base N’Tchinga. Algumas vão ser pavi-mentadas e outras vamos reclassificar o pavimento existente, tornar a pôr a base para depois asfaltar.
Trabalhámos também nas ruas ter-ciárias nos bairros. No ano passado, houve um investimento extrema-mente grande do município nas ruas que desde o tempo colonial nunca tinham sido trabalhadas. Consegui-mos fazer o trabalho, é verdade que em algumas ruas fomos infelizes com as chuvas que caíram.
A avenida 24 de Julho, por exem-plo, foi reabilitada há menos de dois anos, mas hoje apresenta-se em péssimas condições de transitabili-dade. É o problema das chuvas que caíram?
É preciso compreender a com-posição geológica dos solos da Beira. O problema da estrada 24 de Julho é que foi construída ao logo da vala. Fomos infelizes porque na altura que abriram a vala foram retirando solos para construir a base e a sub-base da estrada. Durante muitos anos, essa estrada nunca foi pavimentada.
Nessa altura, circulava-se normal-mente e não encontravam nenhum assentamento diferencial. Mas os camiões de grande tonelagem não circulavam por lá. Quando iniciámos com a reparação da base e a colo-cação do pavimento, os camiões de grande porte começaram a circular. E o lodo começou a reagir e a estrada ficou degradada.
O município não previa a circulação de camiões de grande tonelagem por aquela via? A reabilitação não foi antecedida por estudos económicos e de engenharia?
Se não tivéssemos estudos, teríamos o mesmo problema no prolonga-mento da Kruss Gomes, a partir da Munhava Matope em direcção à lixeira. Tivemos fundo para reabili-tar aquela estrada, mas no âmbito da construção do terminal de carvão (do Porto da Beira) notámos que os camiões da empresa holandesa que entravam para a dragagem do porto e para os aterros tinham 50 toneladas de eixo. E os fundos que nós tínham-os iam até o máximo de 15 toneladas de eixo. Achámos por bem não fazer a estrada, senão teríamos o mesmo problema da 24 de Julho. Estamos a negociar com algumas empresas como a futura fábrica de cimento, a mineradora Jindal, para ver se em conjunto podemos fazer uma estrada que possa atingir 50 toneladas eixo.
Senhor Presidente, até ao fim do seu mandato quais são as estradas que estarão totalmente transitáveis? É preciso compreender que Beira é uma cidade com tanta estrada de terra batida e com tanto movimento de camiões e quando chove tudo fica complicado. E é preciso com-preender o que era a cidade da Beira ontem e o que é a cidade da Beira hoje. A cidade da Beira não tinha o volume de camiões que tem hoje.
Hoje temos em média 600/dia de alta tonelagem que entram na cidade. Muitas das nossas estradas foram concebidas na década de 70, e nessa altura os camiões que existam eram de três a quatro toneladas. O que o município tentou fazer foi assegurar que as grandes estradas que esvaziam a circulação de viaturas da zona urbana para a zona peri-urbana funcionem. Hoje temos o orgulho de dizer que a primeira estrada, que é a rua da Chota, hoje está sendo pavimentada e vai ser inaugurada.
Só para ver o esforço que o execu-tivo está a fazer, estamos a importar da Swazilândia as caixas para fazer a ponte.
Grande parte das estradas vão estar boas até ao fim do mandato, sobr-etudo as de terra batida que foram intervencionadas no ano passado e neste ano vai se passar a máquina niveladora. Não é possível num man-dato aterrar todas as estradas de terra batida. Neste momento, estamos concentrados na substituição do as-falto por pavê, trocar a terra batida por pavê. Já não queremos arriscar em asfalto, porque na cidade da Beira basta chover o asfalto não funciona.
Gostaríamos de perceber uma coisa no projecto de protecção costeira em curso na Beira: Quem mobilizou fundos foi o município ou foi o Gov-erno Central?
Na altura em que arrancou o pro-cesso, eu pessoalmente tive a opor-tunidade de estar na Alemanha para mobilizar fundos do KFW, através do Banco Mundial. É preciso com-preender que no sistema financeiro internacional os fundos mobilizados passam pelo Governo Central. Pelo que, por mais que consiga mobilizar, há acordos internacionais que como moçambicanos temos que respei-tar. Contudo, existem outros fundos que podem passar directamente do financiador para o município. É o caso do fundo que mobilizámos para o saneamento da Beira, onde a União Europeia pagava directamente aos
empreiteiros.
As duas modalidades funcionam…
Sim. O importante é que estejamos seguros, pois há situações pouco agradáveis. Por exemplo, nós ben-eficiámos de um fundo da cooper-ação italiana para as autarquias, mas o que acontece é que temos vários constrangimentos para aceder. Isso porque o fundo era directo, depois passou para o Ministério de Ad-ministração Estatal e agora passou para os governos provinciais. O que acontece agora é que aquilo que é a proposta do Conselho Municipal, o principal beneficiário do fundo, acaba sendo censurado pelo governo provincial.
Por exemplo, nós agora queríamos adquirir dois camiões de lixo porque há interesse do Conselho Municipal nesse sentido, mas o governo provin-cial disse que não, porque o município tem muitos camiões de lixo. O governo provincial não sabe qual é a nossa necessidade nessa matéria.
É que é preciso compreender que a vida útil dos camiões de lixo é difer-ente de um carro normal. Voltando à construção de novas sedes dos bairros, o município vai terminar com o trabalho ainda neste mandato?
Pelas contas que tenho, agora va-mos entregar mais nove. Estão todas quase prontas, existe apenas uma por iniciar que é a sede do bairro Vaz. Não iniciou com as outras porque tivemos problemas de terrenos. Como pode imaginar, o próprio mu-nicípio também tem problemas de espaço. Estamos a negociar com al-guns privados que têm espaços para arrancarmos com as obras. Imagine que se não tivéssemos problemas das sedes, que tipo de investimentos em outras áreas poderíamos ter aplicado o dinheiro. É preciso compreender que ao nível do Conselho Munici-pal da Beira conseguimos fazer algo inédito: Todos os Centros de Saúde urbanos têm ambulâncias compradas pelo Conselho Municipal.
E esses Centros de Saúde já passar-am para a gestão do município?
Infelizmente, ainda há muitas jor-nadas por acontecer. Mesmo agora na reunião dos municípios tive-mos oportunidade de perguntar (ao Ministério da Administração Es-tatal) sobre isso, mas apenas respon-deram que ainda se está em processo de harmonização. O Conselho Municipal da Beira solicitou a transfer-ência de competências em 2007, hoje estamos em 2013, passam seis anos, e ainda continuamos na harmoni-zação. Achamos nós que não faz nenhum sentido, porque o Conselho Municipal da beira já solicitou. Hoje fala-se de cinco cidades, Maputo, Matola, Chibuto, Xai-Xai e Pemba.
Agora a minha questão é: Porquê essas cidades? Que níveis de gestão de centros têm essas cidades e que Beira não tem?
E ao nível da educação, o Conselho Municipal já recebeu algumas esco-las?
A situação é a mesma. Aqui também a justificação do Ministério da Administração Es-tatal é que o município ainda não está preparado?
O problema não é o facto do municí-pio estar ou não preparado. Há inter-esses políticos. Nós todos sabemos qual é o papel do partido no poder junto a essas duas entidades (Edu-cação e Saúde) em processos elei-torais. Portanto, enquanto persistir esta situação de processos eleitorais e interesses políticos é natural que eles não vão entregar. Não faz sen-tido hoje entregar Xai-Xai e Pemba, autarquias que nem têm capacidade de recolha de receitas. E nesta re-união de Maputo ficou claro que os municípios têm problemas na recol-ha de receitas. Mas ninguém disse que a cidade da Beira não faz parte dos municípios que têm problemas de recolha de receitas. O próprio relatório apresentado estava vazio de conteúdo e espelha que não envolveu as autarquias. Se envolveu, foram 41 autarquias e duas foram excluídas (Beira e Quelimane).
Mas a transferência de competên-cias do Estado para os municípios representa encargos para as autar-quias?
O poder é para ser exercido e a lei é para ser cumprida. Está claro na lei 02/97, de 18 de Fevereiro, que a gestão da Saúde primária e da Edu-cação primária são da responsabili-dade do município. O município da Beira conseguiu construir três Cen-tros de Saúde, comprou ambulâncias para todos esses centros e para outros que já existiam. Os salários dos mo-toristas, o combustível e a manuten-ção dessas viaturas estão a cargo da autarquia. Continuamos a fornecer regularmente carteiras a escolas e agora vamos construir, com fundos próprios do município, uma escola
que caiu em Macuti.
O que é que mais resta para provarmos a nossa capacidade de gestão?

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